“O homem que culpa os outros tem um longo caminho a percorrer nesta jornada. O homem que se culpa está no meio do caminho. E o homem que não culpa ninguém já chegou.” – Provérbio Chinês
Podemos nos inspirar no outro, sem nos compararmos ao outro.
Quantas vezes escutamos (ou até dizemos) “ah mas isso não é nada, perto do que aconteceu comigo”, “no meu caso foi muito pior”, “é porque você não passou pelo que eu passei”, “isso não se compara ao que eu sofri”. Eu me refiro aqui a todo tipo de dor e sofrimento, seja de uma origem e/ou manifestação física ou emocional, não difere. Estou falando de dor e sofrimento e imagino que até o mais anestesiado de todos os leitores saiba a que estou me referindo. O que importa é que para aquela pessoa que puxou assunto falando de sua dor, a ferida e o sofrimento estão presentes.
E nos identificamos tanto com a nossa dor, que não é raro entrarmos nesse lugar de comparação, relativização ou ponderação… mas ao fazermos isso, não estamos com a pessoa que sente a dor naquele momento. Como se fosse possível comparar dores, experiências traumáticas, feridas ou até ter um ranking de intensidade de sofrimento.
E muitas vezes nem nos damos conta do quão abusivo, desrespeitoso e até arrogante é falarmos com propriedade quando estamos “de fora” de uma situação que é tão individual.
Nosso corpo só é capaz de imaginar a dor que o outro está sentindo, a partir das nossas próprias vivências. Mas o ponto aqui é que existe muuuuuita diferença. A começar pelas experiências já vivenciadas pela pessoa, que certamente são diferentes das nossas.
Cada ferida é única e individual, com todos os seus particulares contextos, e recebidas por um indivíduo único. Único em sua forma de perceber a vida, com um passado único, em um contexto e momento único da sua vida, com suas heranças únicas e aprendizados únicos. Fazendo da experiência individual algo incomparável.
E em geral, atribuímos esse sofrimento aos fatos que aconteceram, ou seja, damos crédito às circunstâncias e achamos que isso pode tornar a situação comparável. Porém, independentemente do motivo que causou o sofrimento e da intensidade percebida, quando uma pessoa se manifesta sobre sua dor, isto é, comenta sobre seu sofrimento, o que existe por trás daquela sinalização é um pedido de relação. Um pedido de conexão que, se estamos no “modo ser humano”, é um convite à compaixão.
“Se você sente dor, você está vivo. Mas se você sente dor em você ao ver a dor do outro, você é humano.” Tolstoi
É assim com cada um de nós também, pode reparar. A pessoa não está comunicando sua dor para que o outro faça sua análise comparativa, relativize ou a explique teoricamente. Quem sofre se manifesta para que não fique sozinho na experiência, para que o outro possa acompanhá-lo, de forma solidária. No “modo ser humano” é da nossa natureza acompanhar compassivamente aquilo que se manifesta.
Embora isso possa fazer todo o sentido, não é tarefa fácil agirmos assim. Estar compassivamente à dor do outro, envolve sentirmos essa dor. E, claro, é desconfortável e, muitas vezes, angustiante e desafiador, como já trouxemos em outros textos: Na incapacidade de estar com o que sentimos, substituímos a presença pela reatividade.
Porém vale destacar que essa inibição da consciência do que estamos sentindo não é uma defesa que voluntariamente escolhemos… é nosso sistema autônomo que assume o comando para nos defender de uma experiência que não toleramos sentir, fazendo com que não tenhamos consciência da nossa insensibilidade.
Ainda mais quando estamos inseridos em uma sociedade que privilegia o cognitivo ao sensitivo, onde somos bonificados por nossa “insensibilidade” e “racionalidade” para temas tão sensíveis aos humanos, como saúde, bem-estar, natureza, sustentabilidade etc. Somos elogiados pelo que cognitivamente sabemos – “que filho mais inteligente!” – e não apreciados (e muitas vezes somos depreciados) pelo que sentimos – “ai, como você é sensível, já tá chorando de novo?!”.
Então, ao ouvir o outro, muitas vezes buscamos esconder esse desconforto, deixando de acompanhar em presença a necessidade dele, nos anestesiando. Falo “em presença”, porque é fácil (e muito comum) que, de forma reflexa, por ser tão incômodo, testemunhamos a dor alheia com as nossas lentes. Com essa nossa baixa tolerância à sentir o sensível, nos levando a intervir reativamente com base no que imaginamos que o outro precise. Saindo da conexão à intervenção.
Esquecemos assim de um pequeno detalhe, que faz toda a diferença: incluir o protagonista, nos conectarmos ao anseio e desejo do outro, como ser único e com todo o direito de viver a sua própria experiência. Somos tão obstinados pelo agir, por intervir, que não nos damos conta da potência, da segurança e da capacidade curativa que é a PRESENÇA compassiva, inclusiva e respeitosa do outro ao nosso lado nesses momentos.
Isso não é pouco, é o início de tudo. É essencial, para que o corpo acalme, repare e cresça. Saber que não estamos sozinhos, que a minha dor afeta o outro e que o outro está se colocando em sintonia com a minha necessidade naquele momento. Nos traz um enorme conforto existir, exatamente como somos, aos olhos dos nossos.
Não há nada que nos faça mais genuinamente visto do que isso. Por outro lado, há um grande poder em expressar nossa vulnerabilidade, especialmente em companhias reguladas, que além de não explorarem nossa fragilidade daquele momento, ainda oferecem, de maneira sintônica, o que têm em proteção e cuidado.
E para quem está ali a fim de oferecer um colo ou um ouvido vale lembrar que “a felicidade está em não comparar-te com ninguém além de ti mesmo”. Ou seja, a comparação não é com o outro, mas conosco mesmo.
As dores são individuais e não podem ser comparadas. Mas a forma como nos relacionamos com elas em momentos diferentes de nossas vidas, isso sim pode ser reconhecido e comparado. Isso sim está ao nosso alcance e onde podemos colocar nossa energia em movimento…
Fazer de mim uma versão melhor a cada dia, podendo carregar as feridas, dores e sofrimentos do passado de outra maneira em meu presente. Podendo transformar essas “dores em dons” (como diz minha querida mestra Liana Netto) e podendo oferecer uma melhor versão de nós mesmos para o mundo!
Isso é propósito!
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*André Chediek é fisioterapeuta osteopata, Somatic Experiencing Practitioner (SEP), constelador familiar sistêmico e coordenador acadêmico da 5LB Brasil. Estuda as 5 Leis Biológicas há 15 anos.
Na Experiência 5LB e principalmente na nossa Formação continuada, são abordados esse e outros conceitos importantes para uma boa compreensão e aplicação precisa e responsável das 5 Leis Biológicas do Dr. Hamer. Se quiser saber mais, nos envia uma mensagem e vamos conversar ou visite o site e conheça toda nossa jornada de conhecimento juntos!